domingo, agosto 27, 2006

Impulso

Inôcencia cruel de uma criança,
que encantada com as belezas do mundo,
arranca a flor que mal acaba de brotar.
O estalido do talo que se parte,
em harmonia com um suspiro
de prazer e de conquista.
Limpidez da água
que sustenta o caule,
contida num copo sem vida.
Perfume que se esvai,
incipiência que termina,
natureza em forma de perfeição.
Gozo infantil e puro
de um querer sempre inconformado,
mão que estendida, colhe.
Efemeridade da paisagem que contenta.
Petálas murchas que o vento leva
cadenciadas por lamento.

quarta-feira, agosto 23, 2006

Mapa da lua

Mariana: Você vê um coelho na lua?
Alice: Coelho?... Não.
Mariana: Dizem que quem vê o coelho está apaixonado, o desenho do bicho aparece para os enamorados em noite de lua cheia.
Alice: Acho que eu não estou apaixonada então.
Mariana: Jura que não vê?... Para mim ele é tão nítido, ali, com as patinhas para cima, como se esperasse alguma coisa...
Alice: Só vejo a lua mesmo.
Mariana: Faz um esforço, Alice. É só ligar os pontinhos e ver o desenho, assim de perfil... Pelo quê será que ele espera?
Alice: To sem óculos... Pra mim a lua não passa de um borrão amarelo, parece mais uma fatia de queijo do reino.
Mariana: Vi num filme, uma vez... Não lembro o nome do filme... Que os cachorros vão para lua quando morrem. A história era tão triste, o cachorro do garotinho morria e ele perguntava para o avô: "Se as pessoas vão para o céu, para onde vão os cachorros?" E o avô disse que eles iam para a lua.
Alice: Afinal tem um coelho ou um cachorro, na lua?
Mariana: Não é isso... Acho que eu preferia ir para lua...
Alice: Do que você ta falando?
Mariana: Quando eu morrer. Imagina a vista, se de todo lugar vê-se a lua, lá de cima dá para enxergar o mundo inteiro... O que você acha?
Alice: Acho que você já bebeu demais.

Mariana concorda e bebe mais um gole do vinho. Na imagem recortada, o contorno das duas sentadas no telhado da casa, a copa da árvore próxima e um pedaço de céu iluminado pela lua cheia.

sexta-feira, agosto 18, 2006

Sorte do dia

Como faço todos os dias, ou melhor, sempre que entro na internet, a primeira coisa é abrir o orkut, checar as mensagens e fuxicar a vida dos outros. E como as coisas são engraçadas, me deparo com minha sorte do dia “Seu maior sonho vai se realizar”. Acho que foi a maior sorte com a qual o orkut já me brindou durante todo esse tempo de convivência, e penso, nessas exatas zero hora e trinta minutos, esse dia que mal começa promete surpresas inimagináveis. No mínimo estranho, depois de uma gigantesca maré de azar, o destino resolver me consolar realizando, quem diria, meu maior sonho, assim do nada! Que gentil! Aliás, qual é o meu maior sonho?... Não consigo pensar em nada que possa se concretizar em menos de 24 horas, levando em consideração todas as condições previstas para este dia, que chegue perto do meu maior sonho. Já sei! Aposto que vou esbarrar com o Chico Buarque nas ruas de Belo Horizonte e, é claro, ele vai se apaixonar a primeira vista por mim (Serve o Rodrigo Santoro também). O que mais me impressiona na mensagem é a certeza do verbo e precisão da data: vai se realizar hoje! Poxa, para uma notícia de tal grandeza o orkut devia ter me preparado psicologicamente e colocado uma pista na sorte de ontem: olha talvez seu grande sonho esteja perto de se realizar... Ou coisa parecida, e não soltar essa bomba tão de repente. Bom, só me resta esperar e torcer para que os astros orkutianos estejam certos. Já me daria por satisfeita se fosse realizado neste dia um dos meus sonhos mais modestos, sem ressentimentos, prefiro guardar o maior para daqui alguns anos. Depois de tantos desejos frustrados e outros tantos cupidos extraviados, o orkut anuncia a virada, hoje é o grande dia! Que rufem os tambores e soem as cornetas esse é o momento do sonho se tornar realidade.

sexta-feira, agosto 11, 2006

Barquinho de papel

Porta Cartas o papel
Que vira um barco a navegar
As poças que a chuva inventa
Na beira da calçada e no mar

Que nem viração ligeira
Não transforma a vida inteira
E ponto de céu é estrela
Quis te dar estrelas pra iluminar
O céu do teu barquinho de papel

Palavras que o vento toca
Na vela da embarcação
Confessam o amor que não escondo
Apenas dos teus olhos e então

Me jogo na queda d’água
Pra enfrentar a escuridão
Fico com o seu sorriso num barco
De papel e versos a naufragar
Lanço poemas aos peixes cintilantes...