domingo, janeiro 24, 2010

O solo da bailarina

Da noite surgiriam as estrelas,
das estrelas, se de papel fossem, construiríamos móbiles.
Os móbiles, para pendurar, por metamorfose
se transformariam em sinalizadores do vento.
O vento levaria seu canto para bater nas janelas.
As janelas, depois de abertas, deixariam a música invadir a casa.
A música, bem, a música faria tudo mais bonito.
E então você dançaria.
Dançaria como a bailarina que não precisa de palco,
pois bastaria a música.
E só de deixá-la penetrar o corpo e fechar os olhos,
poderia alcançar a lua, e da lua todos a veriam.
E como você poderiam sentir também
o vento, o canto, as estrelas de papel, a música, a noite...
Das janelas abertas.
Suficiente seria olhar para o céu,
e além de olhar poder ver.

segunda-feira, janeiro 18, 2010

O moedor de pimenta

Não era o pinguim de geladeira, não era qualquer presente escondido no fundo do armário, nem a roupa de cama, definitivamente não eram os porta-copos, nem as lembranças, tudo que ela queria de volta era o moedor de pimenta. Como num samba zombeteiro, que canta as desavenças das relações amorosas, ela ria da situação, como se pudesse imaginar a letra do seu próprio samba. Se não fosse sério pareceria cômico. Afinal de contas, ela tinha seguido o caminho, tinha ido em frente, apesar das dificuldades que englobavam deixar tantas coisas e pessoas para trás. Mas o moedor de pimenta... Esse se tornava uma questão de honra. E se para outros a trama fosse mais simples do que complicada, para ela, desatar os nós significava sim, tirar todos os objetos que restavam no apartamento. Mas claro, só levaria o que fosse seu. Pelo simples motivo, de que carregavam uma energia pessoal e intransponível, que não fazia sentido continuar presa naquelas paredes, pertencentes aos cômodos, habitados por pessoas, das quais, naquele momento, precisava se afastar. Normal. Ninguém tem culpa. Ninguém pode prever. Nem ela, nem eles... É impressionante a capacidade do ser humano em se auto-sabotar, quando finalmente atinge a capacidade de sentir, de se apaixonar, não sabe lidar com isso, é muito sentimento, e ai... Bom, e ai de repente as pessoas se perdem, porque se torna difícil dialogar. Acontece. E dessa viagem que se embarca num rompante, o retorno, na maioria das vezes, é deveras complicado. O remédio é mesmo tomar: distância e tempo. Juntos de preferência. Ela já havia plantado uma pimenteira, que começava a brotar. Quem sabe alguns anos mais tarde, tudo seria motivo de graça, e os grandes problemas da época, pareceriam não mais que pequenos desentendimentos. Definitivamente, ela precisava recuperar o moedor de pimenta. Porque a questão estava além do objeto. Será que era muito a pedir?... Vai saber.

quarta-feira, janeiro 13, 2010

( )

Eu não disse nada até agora
porque esse ano começou
com um grande silêncio.
Emudecendo...
Por isso até agora,
não sei muito bem o que falar,
ainda estou me acostumando ao calor de janeiro
a essa sensação de correr dos dias na inércia.
E se é que tem jeito, até que volte para o lugar,
à bagunça...
Por enquanto, em branco protesto,
me calo.
Simplesmente, por não saber outra saída.