segunda-feira, junho 19, 2006

A pianista

Ela abriu a porta, mas só o suficiente para ver quem era.
O rosto encoberto pela fumaça, a mulher dá uma tragada e joga o toco do cigarro no chão, apaga-o com a sola do sapato. O cabelo ruivo com as raízes pretas, a calça jeans puída nas barras e os óculos escuros redondos e grandes. A mulher espera.
A pianista julga permanecer em seu devaneio de outrora, as risadas infantis continuam em sua cabeça a perturbar o silêncio. A sonata, a orquestra, a platéia... Tudo parecia sonho, não sentira seus dedos enquanto tocava, eles flutuaram. E aquela mulher devia pertencer a tal ilusão.
_Alice...
Diz a mulher entre sorrisos. O copo de água que Alice segura cai no chão espatifando-se, e, de repente, tudo se torna real, ela reconhece aquela voz, mas de onde... Não pode lembrar. Os anos pregavam-lhe uma peça, conhecia aquele timbre, não se enganava, porém a quem pertencia? De quem eram os dois olhos negros, que, no momento, encaravam-na como duas jabuticabas maduras?
_Não se lembra?...
E novamente a voz penetra seus ouvidos. A mulher se aproxima e Alice deixa sua mão se desprender da porta, as duas ficam tão próximas que uma pode ouvir a respiração da outra.
_Sou eu, Júlia.
Alice engole em seco, e desta vez, olhando mais atentamente, tirando o peso dos anos dos traços marcados, consegue reconhecer a irmã. No entanto, não podia saber se era a mesma pessoa depois de tanto tempo.
E as risadas infantis voltam a lhe pertubar o sono.

3 Comments:

Anonymous Anônimo said...

reconheci o nome das personagens
quero ler!

00:11  
Anonymous Anônimo said...

marcela.
assim não é justo!
pequenas doses...to viciada ...quero doses cada vez maiores!!!rsrsr

muito bom como sempre! adorei a parte do copo pra acordar a personagem!

bjs

12:49  
Anonymous Anônimo said...

Quantos textos bons, Marcela. Gostei do Blog, simples e com qualidade. Já está aqui, nos meus favoritos. Um abraço, Tatiana

19:08  

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