quinta-feira, dezembro 28, 2006

Sequência 6

As duas seguem na noite fria de um outono qualquer, na rua vazia, sem carros nem transeuntes, sem cachorros vadios pelos cantos. O vento canta seu sopro solitário. Alice vai cabisbaixa, buscando as folhas secas pelo caminho para esmagá-las com os pés.
ALICE: Morreu como?
JÚLIA: Enfarte...
Alice pára senta-se no meio fio, Júlia senta-se ao seu lado.
ALICE: A última vez que o vi, faz tantos anos...
Alice chora.
ALICE: Jurei que nunca mais ia olhar para ele... Mas agora que ele morreu... Me diga, Júlia, você conseguiu?
JÚLIA: O quê?
Alice vira-se para ela, seu rosto é inexpressivo, mas ela chora.
ALICE: Conseguiu perdoar?
Elas desviam o olhar e ficam em silêncio. Júlia acende um cigarro.

sábado, dezembro 16, 2006

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A verdade é que queria ligar, dizer de uma vez aquele bando de coisas entaladas e deixar que ele decidisse. Dali para frente me livraria do peso, e deixaria o peso com ele. Todas aquelas coisas que em conversas mentais discutia comigo mesma, sem chegar à conclusão nenhuma. Mas na hora, nunca dizia, sempre covarde, acho que na vida perdi mais do que ganhei com isso, mas não vou saber. Entre as meias palavras ficava o não dito, e entre o não dito se estabeleciam personagens, debaixo da carapaça não sabia o que existia, se existia alguma coisa, talvez houvesse o vazio. Isso explicaria muita coisa, mas seria triste. Todos os abraços, todos os carinhos e os beijos... Penso nisso como grande farsa, uma peça intimista, reservada para dois, pois público não se permitia, seria motivo de grande alarde. Eu queria o alarde, faltava sinceridade, faltava decisão, por muitas vezes, faltaram palavras. Faltava um poema de Vinícius jogado por debaixo da porta, faltava amor, faltava coragem de se deixar levar e, desta vez, não da minha parte. Faltaram muitas coisas, no final, acho que o quê faltou, na verdade, foi acontecer. De mundos paralelos já bastam os sonhos.

sexta-feira, dezembro 08, 2006

A luz do abajur

Mais uma vez te olho, mais um sorriso seu
E eu que queria tanto, ter-te entre os dedos meus
Os beijos que nunca demos, debaixo dos olhos de quem
Desconhecia os beijos, que escondemos sob cobertores
Teus segredos eu guardo, bem perto dos meus
Teus pesadelos, teus monstros, te darei a mão de noite

E eu que nunca quis gostar, e eu que nunca quis chorar
E eu que não soube as palavras, sofri por você
Capaz de temer a vida, rumores de uma rotina
Mas por favor não fuja, teus olhos dos meus
O doce de uma ferida, amor que não sai, vacila
O roxo da flor, a casa vazia, a luz do abajur, o vento

O tempo de um cigarro, levo a refletir
Nas horas do dia,
Quero o teu respirar pra dormir