quarta-feira, setembro 30, 2009

No Tom

Esqueci o teu nome entre as embaralhadas frases que desperdicei no caderno. Entre os escritos desesperados, onde, lugar este - usei para negar que te amava. Malfadados dizeres que buscavam me convencer que amor era outra coisa. E que escrever resolveria os tais problemas inexistentes. Porque eu não te amava. Assim como também não sonhava, não queria e não lembrava. Você bem sabe das brigas que nunca tivemos e das discussões que terminavam em beijos. Naquelas noites em que eu não dormi com você. Sem falar nas confidências que muito menos trocamos. E se tivéssemos jurado alguma coisa já seria demais. Eu não sei quando foi que nos conhecemos e jamais lembraria do jeito que me olhou da primeira vez. Até poderia pensar que sua voz ainda me soa familiar, mas não, nem isso. Pois nunca houve cinema e nem dias de chuva. Quem sabe se eu fizesse um samba e desmentisse um pouco, existisse solução. Mas como já era de se imaginar, não havia música. Eu me enganei, tantas vezes, e não pense o contrário, pois não era para você que eu telefonava. Muito menos foi por você que eu chorei. Nunca soube o seu nome. E bobagem dizer que não te quis tão sinceramente ao meu lado, pois foi você que me ensinou todas essas mentiras. Para falar a verdade eu nunca escrevi sobre você.

segunda-feira, setembro 21, 2009

Palavras absolutamente esquecíveis

Cala. Se me falta o amor por um instante, cala. E a fina camada que a garoa translúcida deixou na calçada... Cala. Escuta o farfalhar constante das árvores que formam um corredor e no meio a rua. No asfalto os carros passam. A pálpebra de leve treme e aperta os olhos. Fala. Com qual doçura a vida te brindou enquanto a noite esfriava? Que casaco escolheu no fundo do armário para se vestir de você mais um pouco? Que acaso devo esperar para qualquer encontro ao dobrar a esquina? Fala. Bobagens que podem significar nada. Nada. Apenas isso. Não mais que o vazio de palavras absolutamente esquecíveis em minutos. Enquanto fala, tento desnudar a cortina e alcançar-te do outro lado. Para entender se o que realmente fala é o que sente. E se o que sente é capaz de te fazer atravessar a rua e me parar, enquanto caminho desenfreada, na calçada ao lado. E nesse caso, para abrandar a mente, quando muito meus pensamentos se perderem alheios à fala, entre a linha da razão e da loucura vejo o óbvio. Não falta, não cala. A chuva volta. Os meandros do pequeno rio que desliza no canto do asfalto. A noite persiste, o corpo pede, os lábios falam, na mente as palavras confundem, a pálpebra de leve treme antes de apertar os olhos. Cala. Escuta o farfalhar das folhas enquanto o vento passa. Elas debocham do segredo, fazem pouco do beijo. Noite adentro, tempo afora. Preciso tomar fôlego antes de retomar o caminho, por isso paro. Amanhã ainda não é nada. Hoje escrevo, mesmo que as palavras me faltem, para buscá-lo, dar voz ao que me resta, mas se resta alguma coisa, ainda não falta.

terça-feira, setembro 01, 2009

A culpa é da Insônia

Ela veio me visitar ontem à noite. Passou pelo cobertor, fez um afago nos meus pés e dividiu comigo o travesseiro, por algumas horas. Longas horas. Fez meu pensamento trabalhar rápido e não me deixou dormir. Também nem me atrevi, com tantas coisas na cabeça, apenas tentei, discretamente, pegar no sono, sem que ela percebesse, mas não era fácil com sua vigília constante e desisti, logo. Um pernilongo veio zunir no meu ouvido, como se já não bastasse serem quase cinco da manhã e o dia por nascer antecipando o meu cansaço. Enfim, já fazia tempo. Cheguei a acreditar que ela sumiria de vez, que as temporadas clássicas, de noites mal dormidas, faziam parte do passado, agora. Que nada! Vi que ela riu debochada. “Pensou que eu não voltaria?... Quanta inocência!” É, no fundo eu sabia que éramos um pouco dependentes uma da outra e que não tinha outro jeito, nos encontraríamos de novo, na solidão silenciosa da madrugada. A janela aberta deixava a sombra da árvore mais próxima invadir o quarto, seus galhos se mexendo de leve na parede branca. Parecia alguém do lado de fora, que tentava me dizer alguma coisa. E como não havia nada para fazer na monotonia da cama, minha atenção se perdeu naqueles movimentos, nas curvas... Tentava decifrar as formas. O quanto de poesia há na imagem de um galho e suas folhas projetadas na parede? Não sei. Não imagino o que possa ser dito sobre isso. Mas quem sabe? Confesso que existia a saudade escondida no aconchego das cobertas. Esses encontros me faziam escrever mais. Me acalmei e deixei que ela ficasse comigo mais um pouco. As duas deitadas de olhos abertos. O galho na parede, o tempo quente, o respirar ritmado de alguém que dorme na cama ao lado, o primeiro clarear do dia, o pernilongo foi embora, o cheiro de café que vem quase junto do sonho. Quando acordei já era quase meio-dia.